quinta-feira, 23 de outubro de 2014

A Monja Budista e o Diabo



Poética do Demônio


Demônio aqui é no sentido budista, também conhecido em língua páli, a língua que o Buddha falava no século 6 antes da Era Comum (Cristo), uma variante do sâncrito.

O termo que a Budologia usa é “Mara”. Nada tem a ver com o Diabo do Ocidente. “Mara” é uma faceta de todos nós, que ainda não despertamos para a Espiritualidade (Iluminação).

Deste modo, de acordo com as nossas ações e os 6 sentidos (os 5 sentidos mais a mente), podemos ser um Bodhisatva (aprendiz de Buda) ou Mara. São as faces Positiva e Negativa de nossa Existência.

Por outro lado, no Budismo, as noções de inferno são temporárias, nada tem de eterno, pois tudo passa...

Em muitos textos do Cânone Páli, as Escrituras Budistas, encontramos o próprio Buddha e seus discípulos, às vezes, conversando com Mara, aqui no sentido de um Espírito do Mal, que os espíritas e espiritualistas chamam de Obsessor. Claro que Buddha e seus discípulos sempre vencem os debates, mas é natural que ele, o Mal, sempre volte, enquanto este planeta Terra, for uma escola de aprendizado da Luz Superior, um mundo de provas e expiações.

Muitas partes do Tipitaka Páli estão em versos, pois foram recolhidos a partir da Tradição Oral, eram em versos, rimados, para facilitar a memorização. Deste modo, encontramos versos, estrofes e poesias com o Demônio Mara conversando com os praticantes budistas: leigos e monges.

Vejamos um item que está na página 418, do ótimo livro “Ensinamentos do Buda”, compilados por Nissin Cohen, falecido em 2009, grande estudioso do Darma.

O trecho nos fala sobre a monja Somã, filha do capelão do rei Bimbisara, da cidade de Maghada. Ela era considerada iluminada, isto é, atingira um alto grau de santidade.

Belo dia, após o almoço, a sacerdotisa foi meditar na floresta. Vendo-a sozinha o Espírito Mara resolveu atrapalhar a meditação, tentando fazer-lhe medo, estupefação e horripilação.

O Maléfico ficou invisível e pronunciou a estrofe:

“ Esta condição a ser atingida
Pelos videntes, que é difícil de ser obtida,
Não é possível de ser alcançada
Por uma mulher de sabedoria apoucada”.

Somã percebeu intuitivamente que a voz do fantasma era Mara e também respondeu-lhe em versos:

“O que a natureza feminina importa
Quando a mente está estável (e concentrada),
Quando o conhecimento flui continuamente
E alguém vê corretamente o Darma (Doutrina)?
Para alguém que pense assim:
“Eu sou uma mulher”, ou “Eu sou um homem”                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
Ou “Eu sou qualquer coisa” –
Para esse é apropriado Mara dirigir-se”.

Compreendendo que fora descoberto, o Demônio ficou envergonhado e retirou-se.

Comentário:

Foi mesmo um espírito? Acreditamos que sim, e logo de início avistamos o machismo do Diabo, pensando que uma mulher não pode atingir um alto grau de Espiritualidade. E a monja, com sabedoria, responde que os estudantes da Doutrina Búdica estão além desses rótulos: mulher, homem ou qualquer coisa...

Por outro lado, se ela era iluminada, fica difícil deduzirmos que poderia ser um pensamento preconceituoso da religiosa, sobre sua condição feminina, pois os iluminados vivem em plena atenção e não tem esse tipo de raciocínio negativistas, isso é da condição da pessoa comum. E ela já havia transcendido essa condição.

Daí que o mais provável é a abordagem do primeiro parágrafo.

A curiosidade do texto é que tanto o Satanás quanto a monja, eram poetas, daí a chamado do título para fazermos os estudos de Poética.

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